Saturday, March 30, 2013

Arte não é para o seu bico

As pessoas gastam quatro mil reais num aparelho de TV mas não são capazes de gastar quinhentos reais numa pintura decente. O sujeito tem uma casa suntuosa com mobiliário de centenas de milhares de reais e decora sua casa com pôsters e peças decorativas sem nenhuma relevância e gosto extremamente duvidoso. O carro é no mínimo um SUV novo, e a sala decorada com quinquilharias. Tenho visto também uma outra situação curiosa: zero arte nas paredes, nada.

Os brasileiros precisam aprender a apreciar mais a arte contemporânea, muitos de nós apenas visitam museus em Paris e Nova Iorque, não frequentam museus em São Paulo, que são excelentes e de nível internacional.

O mercado de arte tem crescido muito no Brasil, em especial em São Paulo e Rio de Janeiro. É uma interessante opção para o investidor. Em breve teremos mais uma edição da feira SP Arte, no pavilhão da Bienal, com mais de 100 galerias. Uma obra de um artista jovem pode custar barato e em poucos anos seu preço pode evoluir muito. Isto tudo mantendo sua casa muito bonita, seu status elevado e suas visitas encantadas.

Para investir de forma correta é preciso compreender um pouco o que vem a ser a Arte Contemporânea. Resumidamente trata-se da arte do nosso momento histórico. No século passado a arte que predominou foi a Arte Moderna, ela durou aproximadamente de 1900 a 1960, compreendendo no início, por exemplo, a tendência do expressionismo de Van Gogh, e no final por volta de 1960 a gestualidade do expressionismo abstrato de Pollock, que encerra a modernidade, de acordo com historiadores. Observe que Arte Moderna é um período, e a Arte Contemporânea é um outro período histórico, então não estamos apenas falando da “arte de hoje”, mas de uma categoria de arte, um produto bem definido por um circuito oficial institucionalizado. No futuro teremos um outro nome, talvez Arte da Nova Era, ou Pós-Contemporânea e assim sucessivamente. Para investir é necessário conhecer artistas, verificar seus currículos de exposições, verificar seu nível de envolvimento no circuito de arte, se existem textos críticos e catálogos, se o seu trabalho tem uma linguagem ja consagrada pelo sistema de arte, consultar pessoas, dialogar, ler um pouco, acompanhar. Observe que uma cerâmica de Caruarú, ou uma pintura decorativa da praça da República não são consideradas “arte contemporânea”, porque estão fora do diálogo com o meio institucional e histórico. E certamente não serão investimento, mesmo que sejam muito bonitas.

Existe o investidor conservador, e o investidor agressivo. O conservador compra grande nomes, são obras de 20 mil, 50 mil reais, ou 100 mil, que serão mais fáceis de vender depois, graças a notoriedade dos artistas. Mas a valorização poderá ser menor. Uma obra comprada por 20 mil pode ficar com seu preço estagnado por vários anos. Outro tipo de investidor é o de perfil agressivo, este compra obras de jovens artistas promissores, que poderão se adquiridas por 2 mil reais ou 5 mil reais, e em poucos anos sua cotação pode dobrar e ir além, porque são emergentes, embora a liquidez seja menor inicialmente. O conjunto de uma coleção de perfil agressivo pode sofrer uma valorização fenomenal e representar um patrimônio significativo no longo prazo.

“Não é para o seu bico” é uma generalização injusta, como todas as generalizações. É um título retórico que parte do pressuposto que nenhum dos leitores é um comprador de arte, por outro lado serve para chamar a atenção para o fato de que provavelmente a grande maioria não é mesmo, embora pudessem ser. Você pode rapidamente reverter este quadro. Então visite exposições, galerias, e museus, aproxime-se dos artistas, e colecione obras de arte de potencial cultural e representatividade conceitual no circuito instituído.

Ricardo Ramalho